A caça peixe-boi amazônico

 O HOJE SÓ EXITE 500 EXEMPLARES

IBAMA - Os pesquisadores do Centro Mamíferos Aquáticos – CMA/Ibama, em cooperação do Conselho Nacional dos Seringueiros, voltam à Amazônia a partir deste sábado(24/8) para mais uma etapa da pesquisa sobre o peixe-boi amazônico (Trichechus inungis. Durante trinta dias, os pesquisadores do Projeto Peixe-Boi percorrerão rios e igarapés da Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns e da Floresta Nacional do Tapajós, no Pará, para uma série de estudos que ajudarão a esclarecer os cientistas sobre a situação em que se encontra o peixe-boi amazônico em seu habitat natural. A intenção é replicar na região a metodologia usada na conservação do peixe-boi marinho (Trichechus manatus) na região Nordeste que, nos últimos 22 anos, conseguiu conter o extermínio e atualmente representa uma chance de sobrevivência para a espécie.

Em 2000, a equipe coordenada pelo oceanógrafo Régis Lima, chefe do CMA, passou 71 dias na Amazônia e realizou o mais profundo levantamento sobre o peixe-boi na região. O trabalho foi financiado pelo Fundo Nacional do Meio Ambiente. Depois de percorrer os rios Solimões, Amazonas, Madeira, Purus, Jutaí e principais afluentes, os pesquisadores constataram que na maioria das comunidades visitadas ainda se pratica a caça ao peixe-boi para o consumo e o comércio clandestino. Estima-se que 500 animais sejam mortos anualmente na região.

É justamente essa a maior preocupação dos estudiosos. A caça feita de forma indiscriminada foi o que praticamente acabou com o peixe-boi marinho na costa brasileira. Teme-se que o seu primo da Amazônia siga a mesma trajetória. Por isso, um dos focos da expedição será a educação ambiental. Além de mostrar que a caça ao peixe-boi é proibida por lei, os pesquisadores tentarão explicar para os ribeirinhos que o animal é importante para o equilíbrio do ecossistema. Vegetariano, o peixe-boi ajuda a manter os rios e os igarapés livres do excesso de vegetação. Sua dieta pode chegar a até 20 quilos de plantas em um só dia. Se o peixe-boi desaparecer, a reação será sentida em cadeia. As fezes do peixe-boi adubam os rios e estimulam o surgimento do fictoplâncton que alimenta os peixes que alimentam os ribeirinhos.

“Sabemos que é difícil reverter hábitos culturais, mas é possível inserir os ribeirinhos no trabalho de conservação do peixe-boi”, diz Régis Lima. Segundo ele, meta é visitar 110 comunidades nas duas etapas da expedição e levar informações de modo a criar uma nova mentalidade na região. Além de tentar conquistar a população para a causa, os pesquisadores também farão entrevistas e coletarão dados para tentar definir a população desses mamíferos aquáticos. Os dados indicarão as melhores estratégias de conservação da espécie na região.


Fortes aliados

Dede o ano passado, o CMA conta com o apoio do Conselho Nacional de Seringueiros-CNS. Formado em 1985 pelos seringueiros da região, o conselho possui capilaridade em toda a Amazônia. “Com o apoio das populações tradicionais, as campanhas adquirem um caráter de maior aceitação, pois é o próprio ribeirinho quem se incumbe de propagar a informação”, avalia Carla Aguilar, técnica do CNS. A cooperação entre CNS e o CMA está permitindo a reabilitação de dois peixes-bois resgatados há duas semanas por técnicos do conselho. Os animais eram mantidos em locais inadequados em Nossa Senhora de Nazaré, próximo ao município de Ouriximiná, no Pará. Um outro filhote, com18 quilos, foi encontrado amarrado no lago Sapucuá. Na mesma semana, uma fêmea com aproximadamente quatro anos também foi resgatada de cativeiro inadequado numa represa no mesmo lago. Os dois animais estão sendo recuperados na unidade do CNS em Alter do Chão, em Santarém.


Homem é o principal predador

Perseguido e caçado há séculos, o peixe-boi da Amazônia é um forte candidato a desaparecer para sempre da floresta. E não é por falta de proibição. Desde 1967, a Lei de Proteção à Fauna proíbe a caça do mamífero. A infração também está na Lei de Crimes Ambientais. Mesmo assim, o maior mamífero aquático da Amazônia morre às centenas todos os anos. O método de abate é dos mais cruéis: pauladas, asfixia e perfurações feitas com arpões. As técnicas são herdadas de pai para filho em uma sucessão que acabará levando ao fim mais uma espécie brasileira. O trabalho de conservação do peixe-boi na Amazônia é a alternativa para se evitar essa tragédia.